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Acessibilidade: o limite das ruas

Calçadas altas e danificadas não facilitam a locomoção de pessoas com deficiência

Tadeu Janning é obrigado a conviver com as dificuldades de acesso, todos os dias.
Foto: Vitor Miekzikowski

Priscila Zulin Colognese

A cada duas quadras um obstáculo. “Tenho que meter a cara na frente dos carros, correndo o risco de ser atropelado”, conta Tadeu Janning, que enfrenta todos os dias a dificuldade de se locomover pelas ruas de Cascavel. A superação faz parte da história de vida do cadeirante de 52 anos, que teve paralisia na infância e precisou se habituar ao auxílio de muletas. Quando adulto, sofreu um grave acidente de trabalho e desde então a cadeira de rodas virou uma companheira inseparável.

Pela legislação nacional, as vias, os parques e os espaços públicos devem ser adaptados para promover ampla acessibilidade às pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. Mas a realidade enfrentada está bem distante do que está escrito na Constituição Federal. Não precisamos ir longe para perceber a falta de acessibilidade. Calçadas sem rampas e totalmente quebradas estão entre os problemas mais notórios.

Tadeu Janning é hoje parte integrante da Adefica (Associação dos Deficientes Físicos de Cascavel). Ele e os demais cadeirantes da cidade enfrentam algo muito pior que a limitação física: a discriminação, inclusive do poder público, que não consulta o grupo quando são feitos investimentos na infraestrutura da cidade. “Antes de aprovarem um projeto [a Prefeitura e órgãos responsáveis] os engenheiros deviam usar uma cadeira de rodas para ver as dificuldades que a gente tem”, desabafa.

A entidade atua na defesa e garantia dos direitos da pessoa com deficiência, que hoje somam 1,9 mil só em Cascavel, além de dar orientação e suporte. “As pessoas com deficiência vêm até nós e são encaminhadas para onde precisam: médicos, ortopedistas, fisioterapeutas e até fazer passe livre”, conta Marcos Antonio da Silva, presidente da Adefica.

O principal problema apontado pelas pessoas com deficiência é o descaso no sentido de adaptar os ambientes efetivamente ao que elas precisam. “A rampa tem que ter 0,5 centímetros por metro de inclinação. Por exemplo, na rodoviária a rampa tem 0,10 centímetros por metro. Isso para um cadeirante é um problema, uns não tem força no braço, então fica muito difícil”.

Jucimar de Souza Queiroz, 48, conta que mesmo sendo cadeirante, hoje leva uma vida normal, dentro de suas limitações, mas no primeiro ano, depois de sofrer um acidente, a adaptação foi difícil. “Com o tempo eu fui adquirindo experiência e tocando a vida, mas as dificuldades ainda existem”. Ele lamenta que o acesso só exista em regiões centrais da cidade. “Hoje nossa briga maior são as calçadas e pontos de ônibus. Não só no centro precisa haver acessibilidade, porque eu não vivo no centro, eu vivo no bairro”.

 

Não é apenas andar na rua

O dia a dia de uma pessoa com dificuldades de locomoção passa a ser mais complicado quando o lugar que ela pode ir é delimitado pela falta de estrutura adequada. E na maioria das vezes, a falta de empatia cria a ideia de que o mínimo é o bastante, sem a percepção social de que os deficientes físicos tem uma vida como a de qualquer outra pessoa. Afinal, eles não andam apenas nas ruas, mas também frequentam lojas, compram roupas, vão ao mercado, farmácia e saem para jantar.

“Sinto-me constrangido. Porque quero entrar em uma loja, para comprar alguma coisa, e acabo sendo discriminado, não conseguindo ter acesso ao interior da loja ou departamento. Acabo sendo atendido na calçada”, conta Antônio Ravilson Filipack, 45, que é cadeirante desde o ano de 2001, quando sofreu um acidente. Ele diz que opta por não comprar em estabelecimentos que não tem acessibilidade.

 

 

 

A psicologia explica

Desde o início da vida o desenvolvimento da autonomia é essencial para qualquer ser humano. Mais ainda no caso das pessoas com deficiência, que acabam sendo vistos pela sociedade, e até dentro de casa, como incapazes de realizar atividades sem auxílio.

Para a psicóloga Gislaine Genaro, a falta de acesso na cidade faz com que o indivíduo não tenha essa liberdade e ele acaba se sentindo sem valor. “A pessoa fica presa na própria deficiência, dependente de outro para tudo”, comenta a especialista.

“Os deficientes precisam ter o direito de ir e vir, sem causar constrangimento. Isso tem que ser promovido para que eles não se sintam ‘coitadinhos’, que não conseguem fazer nada”, explica Gislaine, alertando que esse tipo de situação afeta diretamente a autoestima.

Por conta desses constrangimentos, muitas pessoas com deficiência acabam por se isolar em suas casas e se sentindo um incômodo à sociedade. “É uma dificuldade tão grande sair de casa, depender do outro, que eles acabam ficando sem escolha”, afirma a psicóloga, relatando que é muito comum esses deficientes desenvolverem depressão e/ou ansiedade, sendo capazes até de cometer suicídio em casos mais extremos.

 

Outros grupos

Não pense que essas dificuldades em andar nas ruas da nossa cidade afetam apenas os deficientes físicos. Zenilda Ribeiro, 65, diz que é muito difícil andar em locais onde não há acessibilidade. “É necessário renovar todas as calçadas, principalmente as quebradas. Porque a gente tropeça, e acaba caindo. E isso é em vários lugares, não só no meu bairro”, conta a idosa.

“No meu ponto de vista, a respeito das calçadas, em alguns lugares está péssimo para andar. Conforme o lugar é complicado, já vi gente caindo”, relada Valdevino Villaca, 66, ressaltando que as ruas não estão em boas condições.

Esses problemas nas vias cascavelenses afetam também os ciclistas, que por falta de ciclovias nos bairros, são obrigados a andar pelas ruas ou calçadas. O ciclista Murilo Ito, 35, comenta que a instalação de ciclovias mudaria a realidade de quem utiliza a bicicleta todos os dias. “Falta também respeito por parte dos motoristas”, comenta.

Integrantes da Adefica (Associação dos Deficientes Físicos de Cascavel). Foto: Vitor Miekzikowski
Pontos de ônibus da Av. Brasil não têm o rebaixamento no meio-fio. Foto: Vitor Miekzikowski
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